terça-feira, 1 de maio de 2018

A minissérie de Wolverine: a reinvenção de um personagem, de um leitor, de um ser humano



Em 1982, Wolverine ganhou sua primeira história solo, mediante a sua grande popularidade entre os fãs da equipe mutante X-Men. Seria uma minissérie, em quatro edições, roteirizada pelo mesmo roteirista do principal título mutante, Chris Claremont, e com arte e também participação nos roteiros de Frank Miller, até então em ascensão na indústria, onde futuramente, se tornaria um de seus maiores ícones.
Em 2003, o filme X-Men 2 seria lançado no mês de maio. Este filme mudaria minha vida para sempre. Tendo visto o primeiro filme dos X-Men apenas dias antes de ver o segundo, numa exibição em um canal de TV aberta, o acaso acabou me presenteando com a ida ao cinema, simplesmente por não ter ido até lá no horário do filme que minha mãe queria de fato ver. Então, para não esperarmos um longo tempo, acabamos indo e vendo o que estava passando na hora, que era justamente X-Men 2.
Inevitavelmente, o interesse pelo filme, e de forma mais específica, pelo personagem Wolverine veio, e a pesquisa acarretou em algo que não imaginava ao longo dos meus 10 anos de idade: que suas origens estavam nas histórias em quadrinhos. Nada que uma ida a banca de jornal não pudesse resolver. Porém, se comparado o preço das HQs de banca, em torno de 6 reais na época, com as de uma livraria de livros antigos, onde podia-se comprar ainda no formatinho por 2 reais, esta última opção pareceu mais viável.
Entrando lá, a partir da entrada, no canto esquerdo, encontravam-se pilhas de HQs em formatinho de Wolverine. Ainda muito cru nesse mundo de leitura, optei por comprar dois números de uma história que parecia sequencial, por dois motivos bem bobos: Um deles, era porque eram mais finas que as demais, então poderia ler mais rápido. O outro, é porque folheando elas, percebi que as cenas de ação não conteriam diálogos, o que aceleraria mais ainda a leitura. Dito e feito.
Ao chegar em casa, reparei um detalhe que passou despercebido. Havia comprado as edições número 2 e 4. Independente disso, a diversão naquela inofensiva tarde foi imensurável, mesmo sem sequer ter a mínima noção do que realmente a HQ estaria passando.
A ideia aqui após este relato é traçar um paralelo. Honrando o título do blog, “O Crítico”, farei uma crítica sobre a minissérie de Wolverine, sua primeira história solo no mundo dos quadrinhos. Ao mesmo tempo, usarei minhas diferentes percepções ao longo do tempo sobre o que realmente me encantava quando falava sobre esta história com outras pessoas, até chegar ao estágio atual, de um leitor mais amadurecido. Encerrando, espero conseguir falar sobre lições que a minissérie trouxe para minha vida, para que me permitisse crescer como ser humano, assim como Logan cresceu como personagem.

A REINVENÇÃO DE UM PERSONAGEM
Chris Claremont havia dito que o personagem Wolverine se encontrava em um estado unidimensional. O personagem não passava de um assassino psicótico, que poderia matar alguém caso ele desse bom dia no tom errado. O que Claremont pretendia com a minissérie era mudar isso, realizar uma desconstrução, onde Logan se tornaria um “samurai defeituoso”. Se para um samurai o dever é tudo, para Wolverine, a dificuldade em se manter nesse aspecto seria tão grande que ele adotaria seu próprio código de conduta.
Além disso, o autor já deixou claro que um personagem não deveria permanecer estático, pois isto tiraria sua “alma”. Então, para Wolverine, chegava a hora de sua reinvenção, onde Claremont faria um caminho inverso ao habitual. Ao invés do argumento definir o personagem, ele partiria de uma pergunta: “Quem é Wolverine?”
A minissérie era um recomeço, mas não quer dizer necessariamente que começaria do nada. Aproveitando que Wolverine havia conhecido, em X-Men número 118, uma jovem japonesa chamada Mariko Yashida, Claremont aproveitaria este interesse do herói pela moça para desenvolver sua história.
É interessante ver que esse processo de mudança em torno do personagem está explicitamente mostrado nos títulos de cada um dos 4 números: Eu sou Wolverine, Deveres e Obrigações, Perda e Honra.

Eu sou Wolverine
Neste primeiro número, vemos um grande destaque ao lado animal de Wolverine. Desde a paisagem das selvas canadenses, seu enfrentamento com um urso pardo na selva, seu desgosto pelos humanos que causaram o sofrimento ao urso, e de sua frase característica, da qual ele falou neste número pela primeira vez:
“Eu sou o melhor naquilo que faço, mas o que eu faço não é nada agradável”
A premissa nos é apresentada. Wolverine estava mandando cartas a Mariko Yashida, mas todas elas estavam voltando. Seu amigo Asano Kimura discorre sobre a situação complicada no qual a amada de Logan está. Com a volta de seu pai, Shingen, ele a obrigou a se casar. Embora Asano tenha pedido paciência, Wolverine parte para a missão.
Durante sua abordagem, mais uma menção ao lado animalesco de Wolverine, que em seus pensamentos deixa claro para o leitor que não irá sacrificar os cachorros de guarda, mas não terá piedade dos humanos. Ao chegar a Mariko, o susto: A jovem tem marcas de agressão, sofridas pelo marido. Por falar nele, ele chega no local, enquanto Mariko explicava sua complicada situação. Wolverine só não o mata a pedido dela, e outro personagem entra em cena: Shingen.
Shingen havia arremessado shurikens envenenadas em Logan. Depois de uma conversa, ele o desafia para um duelo empunhando bokans, espadas de madeira, alegando que o herói não era digno de uma luta com espadas de verdade. Shingen derrota Wolverine facilmente, mesmo com o mutante chegando a usar suas garras por um momento. Aqui, o lado animal do mutante acabou o levando a ruína, derrotado e humilhado frente a mulher que mais ama.
Abandonado na rua, ele encontra uma misteriosa mulher, que irá deixar as coisas mais interessantes a partir do próximo número.

Deveres e Obrigações
Acordado às pressas, Wolverine parte para a luta contra ninjas do tentáculo que estavam lá para mata-lo. A sequência é primorosamente desenhada por Frank Miller, sendo um dos pontos altos de arte dentro da minissérie. A misteriosa mulher que o abordou e o acordou era Yukio, que praticamente era obcecada por Logan.
É interessante vermos que Yukio e Mariko fazem paralelos a personalidade de Wolverine. Yukio representaria o lado instintivo de Wolverine. Ela diz que daria a vida para ser como ele, ter suas habilidades. Mariko em contrapartida, quer seguir uma vida mais correta, e buscar ser uma pessoa melhor.
Durante a história descobrimos que Yukio na verdade estava trabalhando para Shingen, mas por estar apaixonada por Wolverine, estava agindo de forma insatisfatória, a ponto de Shingen a repreender. Conhecemos o plano do pai de Mariko, que é se tornar o rei do crime do Japão.
Yukio volta a Logan e os dois vão até uma peça teatral, que era uma fachada para que Katsuyori, alvo de Shingen, fosse morto. Wolverine intervém, e faz uma sangrenta luta, mais uma vez maravilhosa desenhada por Frank Miller. Considero este número 2 como o melhor no quesito arte, graças as sequências de ação. Importante ressaltar que na plateia deste teatro, estavam também Mariko, Noburo, além de Katsuyori e sua esposa.
Ao final, a derrota foi dupla. Yukio conseguiu o que Shingen queria, causando uma explosão no carro matando Katsuyori e sua esposa. Enquanto isso, Mariko fica completamente arrasada ao ver o que o lado mais selvagem de Wolverine é capaz de fazer. O fundo do poço de Wolverine era ainda maior que o da primeira edição.

Perda
O clima deste terceiro número da minissérie já é ditado em sua capa, com Wolverine melancólico e o uso de cores escuras no fundo e em seu rosto. Ao começarmos a leitura, Logan está afogando as mágoas num bar, brigando e bebendo, na companhia de Yukio. Asano o encontra, mas Logan recusa ajudar seu amigo e parte com Yukio.
Praticamente bêbado, Logan dorme e sonha. O sonho traz um elemento bacana para entendermos como está a mente do mutante mediante a toda essa situação. Lá, Wolverine é um cavaleiro rude, mas corajoso, e está atrás de sua amada. Mas, o cavaleiro é derrotado brutalmente, e finalizado justamente pela mulher que ama. O que entendemos com tudo isso? Que Wolverine está morrendo de medo do que poderá acontecer.
O tentáculo vai até Yukio tentando obriga-la a matar Wolverine, sem sucesso. Mas isso não quer dizer que ela deixará todos os seus deveres para trás. Yukio invade o escritório de Asano e o assassina. Logo depois, é Wolverine quem chega, e ele descobre que Yukio não só matou seu amigo, mas que fez de Wolverine uma peça importante para tirar pessoas do caminho de Shingen até que ele alcançasse o controle do crime no Japão.
Quando Wolverine chega até Yukio, o tentáculo surge. Furioso, Wolverine derrota todos os ninjas. Depois disso, o mutante encontra espaço para reflexão. A luta ocorreu num jardim zen. Logan explica que este jardim seria uma representação de um espaço de paz e tranquilidade, mas que quando ele chega nesse ambiente tranquilo, tudo vira uma bagunça, que era então o atual estado do jardim. A história de sua vida, segundo o mutante. Ele fala sobre Yukio, que quer ele como ele é, sobre Mariko, que faz ele querer mudar. Ao arrumar algumas peças do jardim, ele chega a solução: tentar. Há inclusive uma metalinguagem interessante, onde Wolverine diz que a estagnação é a forma mais horrível de morrer, então qual a razão de não tentar mudar?
Considero a terceira etapa da minissérie a que definiu a reinvenção do personagem Wolverine. Aqui, ele ganhou as três facetas de sua personalidade que considero fundamentais para que ele possa ser compreendido. A fera; O fato de estar propício a usar força letal contra seus oponentes; Sempre tenta melhorar enquanto pessoa. Os objetivos preestabelecidos estavam feitos, faltava fechar com chave de ouro.

Honra
Chegamos ao último número da minissérie. Wolverine vai destruindo o império de Shingen aos poucos, e dá o aviso: “Esta noite”. Shingen se prepara para a luta e lamenta ter subestimado o herói mutante. Mariko está desesperada, sem saber o que fazer mediante a grave situação em que está. Enfurecido Shingen quer punir Yukio, mas Mariko o impede.
Wolverine chega. Noburo ameaça matar Mariko mas Yukio o mata primeiro. Mediante ter salvado sua amada, Logan deixa Yukio fugir. Ao chegar a Shingen, Logan pergunta se ele agora, é digno, fazendo referência a luta do primeiro número. O confronto é tão duro quanto o primeiro, mas desta vez, o mutante vence, matando Shingen.
Ao final, Mariko encontra seu pai morto. Ela discursa para Logan, dizendo que os deveres do clã trariam uma obrigação a ela de mata-lo. Mas, mediante a todo o desgosto causado a história e legado do clã pelo seu pai, ela irá adotar uma medida diferente. Tentará trazer tempos mais calmos, e isso implica em não matar Logan, mas sim, presenteá-lo com a espada do Clã Yashida, e preparar um casamento para os dois.
Os arcos são fechados dentro deste último número de forma brilhante. Wolverine é recompensado pela sua mudança de comportamento, Mariko enfim ganha a coragem necessária para fazer o que é certo, e Yukio segue sua filosofia de vida, vivendo como quer, seguindo suas próprias regras.
Vale também ressaltar que o vilão da história, Shingen, foi bastante efetivo. Todos os esforços da história estavam em torno de desenvolver Wolverine como personagem, e usando os demais para reforçar isso. Shingen colaborou com seu plano, e também uma espécie de oposto a Wolverine. Enquanto o mutante é bruto por natureza mas anseia uma melhora de comportamento, Shingen tem uma pose de tradição, de homem correto, mas que é extremamente egoísta e abandona sua honra trapaceando em suas lutas.

A REINVENÇÃO DE UM LEITOR
Voltando a história que contei no início, meu primeiro contato com a minissérie foi com os números 2 e 4. E a razão de minha escolha se deu principalmente, pelo pequeno tamanho das revistas e poucos diálogos nas cenas de ação.
A coisa fica interessante se parar para pensar que eu acabei escolhendo HQs escritas por Chris Claremont, que sem dúvida é um dos autores mais prolixos dos quadrinhos, pelo simples fato de que achei que elas seriam rápidas de se ler. Obviamente que numa busca futura pelo autor, e vendo a imensa responsabilidade que ele teve como escritor e construtor de grande parte da mitologia mutante, veria que seu trabalho estava longe de uma leitura rápida, muito pelo contrário. Além de escrever muito, ele ainda amarrava os ditos “subplots”, que eram pequenos momentos nas histórias que viriam a ser lembrados em edições futuras, assim como aconteceu nessa minissérie que analisei anteriormente.
E aproveitando o gancho para voltar a história de Wolverine, percebi que alguma coisa estava errada quando eu fui a um despretensioso almoço com meus pais, e mais uma família vizinha, até a casa de parentes. Os dois números da minissérie eram meus fiéis escudeiros, e eu os levava para tudo que é lugar, e neste almoço não foi diferente. Então, uma pessoa chegou para mim e disse que tinha lido a história. Na falta de pessoas para conversar que tivessem gosto também por quadrinhos, a empolgação foi imediata. Mas, a empolgação deu lugar ao nervosismo com uma pergunta: “O que você pegou de lição da HQ?”
Essa pergunta foi responsável pela insegurança momentânea, que foi imediatamente percebida pela pessoa que me fez esta pergunta. Então ela já se prontificou em responder, dizendo que era a de você tentar ser sempre mais do que aquilo que você é, e acima de tudo, do que dizem que você tem que ser.
Naturalmente, ao longo dos 10 anos de idade que tinha, focar primeiro na ação e no lado “legal” dos super-heróis era o caminho. Era legal ser fã do Wolverine, as lutas eram intensas, os poderes o permitiam ser um lutador imparável, além é claro do visual do personagem, no seu glorioso uniforme marrom. Mas, será que também haveria um lado legal nele enquanto pessoa? Algo que o personagem pudesse realmente inspirar?
O caminho foi então procurar os números 1 e 3 da história. Achados, reli em sequência, mas ainda assim, a ação era o que mais me encantava, e não conseguia colocar na minha cabeça, através das palavras, essa tal lição presente ali naquela história. Resumindo, eu simplesmente não estava compreendendo aquilo que ela de fato estava querendo passar.
Durante essa época, indo para além das histórias em quadrinhos, também vinha seguindo a lógica da ação acima de tudo. O desenho X-Men Evolution, que era o que estava em evidência nessa época, já me incomodava bastante antes de conhecer de forma mais profunda os X-Men dos quadrinhos. A razão era justamente por ficar chateado com as cenas de ação, especialmente as que envolviam Wolverine. A solução para mim eram os quadrinhos, os filmes, que até então só estavam ainda em X-Men 2, e começar a assistir mesmo que em trechos presentes no YouTube, o desenho animado dos anos 90.
Alguns anos mais tarde, resolvi ler X-Men de forma mais assídua. Vendo um pouco de Wolverine antes ainda da minissérie, ainda era difícil captar o porquê de sua grande importância como lição e também para o personagem. Eu gostava, mas era incapaz de dizer a razão de sua grande genialidade.
Ao entrar na faculdade, durante o meu aniversário no ano de 2011, pedi de presente o encadernado com a minissérie, em capa dura. Ao ganhar, fui reler. Naquele ano, já estava acompanhando a cronologia mutante, e tinha uma experiência muito maior com quadrinhos. Além disso, minha preocupação com roteiros já estava infinitamente maior, aguçada principalmente por um... desenho animado. E este desenho foi Wolverine e os X-Men, que inclusive já fiz análise neste blog. Gostei tanto da história construída em torno dos melhores arcos de X-Men, adaptados para uma série episódica, que comecei a prestar mais atenção em história e personagens, fazendo eu amar mais ainda o desenho mutante, e começando a questionar mais outros que não conseguiam fazer isso com tamanha maestria.
Relendo a minissérie, consegui pela primeira vez pegar aquilo que ela estava passando. Além da história, o prefácio escrito por Chris Claremont ajudou muito a entender o que estava sendo feito ali. Ao ler, peguei a ideia de que o Wolverine que eu sempre fui fã, e continuo sendo, tinha sua essência construída naquela história, e que aquilo seria levado dali em diante, o transformando em um dos maiores personagens da história dos quadrinhos.
Finalmente posso responder à pergunta que me fizeram, e a outra até mais desafiadora: Por que esta é a história definitiva de Wolverine?
Sem dúvidas, a ironia do destino chegou a Chris Claremont. O autor planejava matar o personagem, que só ficou vivo porque foi “adotado” por John Byrne, seu parceiro na melhor fase da franquia mutante. Aquele que iria ser morto, acabou de fato “nascendo” como um personagem completo nas mãos do próprio Claremont dentro da minissérie.
O objetivo do autor estava claro: desconstruir Wolverine. A ideia do samurai falho encaixou como uma luva: o fato de Wolverine seguir seu próprio código de conduta deu um incremento a personalidade do mutante. A minissérie trouxe a Wolverine o aspecto mais vital para ser um grande personagem: tridimensionalidade. Ele pode usar a força letal, mas pode também não optar por isso. Ao mesmo tempo que é violento, tem um senso de honra. Praticamente foi estabelecido Wolverine como o mais “durão” dos heróis, mas talvez o mais “mole” dos anti-heróis, e é justamente esse o ponto: equilíbrio.
Esse caráter de “definitivo” é notório, pois de certa forma, a maioria das grandes histórias do personagem seguem essa linha pautada no tripé assassinato-fúria-pessoa melhor. Talvez, a única das “grandes” que consiga existir sem beber dessa fonte seja Arma X de Barry Windsor-Smith.
É interessante ver que o ator Hugh Jackman já disse em entrevistas que essa é sua história favorita do personagem e sua grande influência na hora de encenar o personagem. Aliar o caos que é Wolverine ao “rigor” característico do Japão foi uma jogada de gênio. Dar a ideia de Wolverine como uma força sem direção que está em constante desafio ao seu animal interior permitiria a ele se apaixonar (como foi com Mariko) e também a ser uma figura paternal (Especialmente com Kitty Pryde e Jubileu). Por fim, vale ressaltar que essa loucura não pode ser controlada, e que isso torna Logan solitário, com medo de se relacionar com as pessoas, um certo medo de intimidade, tão falado pelo diretor James Mangold ao trabalhar o personagem nos filmes Wolverine Imortal e Logan.
A minissérie de Wolverine me ajudou a crescer como leitor, mas ela não ficou só nisso. Conseguiu ir além.

A REINVENÇÃO DE UM SER HUMANO
O sentimento de arrependimento define uma lamentação por algo mal feito, algo que desejamos de certa forma fazer melhor.
É comum de minha parte parar para pensar em coisas que fiz na minha vida. E esse sentimento ruim de arrependimento que temos surge quando pensamos de que forma poderíamos ter agido diferente, e quem sabe, a resolução da situação não tivesse sido melhor.
Embora esteja longe de ser uma pessoa muito vivida, os arrependimentos que possuo perpassam pelos tempos finais de minha infância e período de adolescência. Aprendi cedo que a mentira pode ser uma consequência grave, que pode prejudicar as pessoas através de seu egoísmo, de querer que as coisas sejam não como tem que ser, mas sim da forma como você acha que é. Na escola, ainda mais sendo criança, não se pensa em muitas coisas que se faz. Sempre fui um aluno compromissado com as tarefas escolares, era difícil um erro ser cometido. Mas o mínimo poderia ser fatal. Em uma tarefa fácil, mas me deparei com uma situação até então inédita. Uma nota muito suavemente mais baixa do que o normal, tão suave que nas notas finais, talvez sequer fizesse grande diferença assim. Mas, a pressão dos amigos era presente. “Como é que pode logo você não ter tirado nota máxima num trabalho fácil desse?”. Não fiz a escolha certa após aquela situação, que me ensinou na frente de meus pais de que mentir não era a melhor escolha, especialmente quando você se depara na consequência que outras pessoas podem ter com aquilo que você faz de errado.
Naturalmente a situação poderia se repetir. Por duas vezes, acreditei que a mentira seria necessária, especialmente por não acreditar que meus pais pudessem entender a injustiça sofrida por mim naquelas situações. Escolher ser solitário não foi, não é e jamais será o melhor caminho. E assim se concluíram essas duas outras situações, com grande decepção por parte de meus pais e humilhação por minha parte.
Com o passar dos anos, penso muito nesses dias de infância e adolescência. Como que escutar outras pessoas, que na verdade estão longe de quererem algo de bom para você, pode ser danoso ao indivíduo. E acima de tudo, como escolhas erradas podem te prejudicar mais ainda, e causar dor pelo fato de que a culpa no fim das contas, é só sua. É natural perder a esperança em seguir em frente, especialmente com uma personalidade que se exige bastante, ter os percalços pode parecer o fim do mundo.
Nunca acreditei muito na ideia de HQs como um escapismo. Com aquela explicação clássica de que se você tem uma vida ruim, irá buscar algo melhor na ficção. Longe de que eu tivesse uma boa convivência durante meus anos no ensino fundamental especialmente, muito pelo contrário. Eram situações incômodas para mim e também para os poucos amigos com qual eu tinha contato constante.
Todavia, é justamente aí que essa minissérie entra, e me ajuda a ter uma inspiração, e também, um escapismo. Assim como Wolverine, também cometi meus erros ao longo da vida. Então, hoje, caberia a mim fazer a escolha que a história se apresentou a Wolverine: a pior das mortes (morte metaforicamente falando) na estagnação ou a tentativa constante de mudança. Ainda antes de entender a lição da história, realizei essa mudança na minha vida, e hoje, vejo que me encaixo nela perfeitamente. O segredo, segundo Logan, não é ganhar ou perder e sim tentar. E acima de tudo, aceitar a você mesmo, mas sem ficar usando a capa do “sou o que sou” como justificativa para mais erros. É por isso que a busca pelo melhor em cada um de nós é justamente o grande tesouro que a minissérie de Wolverine tem para contribuir com todos nós.
Assim como Wolverine, eu cresci e melhorei, e continuo buscando isso. Espero que cada um que em algum dia de sua vida, dedique tempo a ler esta obra, tenha a ganhar tanto quanto eu ganhei, ao compreendê-la e aproveitá-la o máximo possível. Não são só quadrinhos. Não é só um super-herói. Para mim, é muito mais do que isso.